Banco de jardim
(Imagem aqui)
O banco de jardim que tem a tinta gasta podia escrever um romance, daqueles grossos, com inúmeras páginas e personagens quase reais.
Podia colocar no seu romance, como figura de destaque, o sem abrigo que todas as noites dorme quatro horas na sua companhia. Podia narrar os acontecimentos que o empurraram para uma vida errante nas sujas ruas da cidade e todos se iriam emocionar ao ler as sua tragédias pessoais. Todos, até mesmo aqueles que sentem repulsa quando passam por ele na rua.
Também podia contar a história daquele casal fofinho que tomou a decisão de juntar os trapinhos ali, na sua companhia. Ele que é um desbotado banco de jardim, às vezes, ainda tinha destas alegrias. Lembra-se bem da forma como se beijaram e juraram amor eterno.
Talvez conseguisse descrever a história mais horrível a que assistiu, que durante anos tentou apagar da sua memória sem sucesso, a história da menina de treze anos que foi obrigada a perder a virgindade com alguém com o dobro da sua idade, ali, ali mesmo, naquele pedaço de chão à sua frente. Neste dia ele desejou não ser banco de jardim.
Podia falar, claro está, dos pombos que o circundam, que às vezes se aliviam por ali, mas que gastam o seu tempo, sobretudo, à procura de migalhas esquecidas.
Ou dos velhotes que se sentam para descansar as pernas e acabam por passar pelas brasas. Ou dos jovens que se sentam completamente desligados do jardim, mas conectados ao mundo. Ou da rapariga ruiva que nos dias úteis, às 13:45h, vai ali comer a sua sandes embrulhada em papel de alumínio.
Tantas histórias para a memória de um velho banco. Tantas vidas que passam por ali. Tantas outras que o ignoram.
Ele é um banco, sim, consciente da sua imobilidade, mas seguríssimo da sua importância na sociedade.