A Inês
Conduzia sem rumo há mais de uma hora. A raiva, o desespero e uma tristeza profunda tinham tomado conta de si nos primeiros quarenta minutos. Os olhos ardiam-lhe devido às lágrimas que havia derramado.
Passavam das 19h.
Agora senti-se vazia, como se tivesse ficado oca por dentro. O corpo ardia-lhe. Não sabia onde aquela estrada a levaria, nem sabia se teria forças para parar. Haviam-lhe puxado o tapete. Sem avisos prévios. Nessa tarde a vida havia-lhe dado uma enorme bofetada. Não sabia o que fazer. Só de pensar em relatar a alguém o que lhe acontecera ficava nauseada. Desejava a todo o custo acordar. Acordar do pesadelo que estava a viver.
O telemóvel tocou. Pousado no banco do passageiro o telemóvel tocava despreocupadamente. Inês não o ouviu. Não viu que era o Afonso quem lhe ligava. Afonso que já estava em casa, longe, muito longe de imaginar o que acontecera à sua namorada, apenas queria saber se podia encomendar o sushi para as 20h.
Por essa altura Inês mudou abruptamente de direção, precisava de sair do carro. Parou junto à praia. Correu pela areia como se alguém a perseguisse e entrou no mar. Precisava de lavar-se. Precisava de tirar de si os vestígios daquele ser imundo com quem trabalhara até hoje. Precisava de esfregar até à exaustão cada pedaço da sua carne em que ele havia tocado. Sentia-se suja, imunda mesmo. Pensava que jamais iria esquecer o bafo dele no seu pescoço, a força com que a empurrou, as suas mãos gigantes e impuras a tocar cada centímetro da sua pele.
Inês não se reconhecia. O seu chefe não a havia somente violado, havia-lhe roubado a crença nos outros, havia-lhe tirado a jovialidade do olhar e o sorriso constante. Inês foi violada e corrompida. Física e psicologicamente Inês havia sido transformada para sempre.
(Imagem aqui)