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há mar em mim

05
Set22

Uma espécie de Carta Aberta ao Ministro da Educação e a Todos os Sindicatos de Professores

C.S.

Tenho 35 anos, quase 36 e sou professora desde 2008. Escrevo esta carta aberta movida pelo cansaço. Sim, estou cansada depois de um mês de férias. Estou cansada, tal como tantos dos meus colegas espalhados pelas escolas do país. Estou cansada de um governo que não respeita minimamente os professores. E estou cansada dos sindicatos também. É esta a dura verdade. Porque neste momento sentimo-nos sós e sentimos que ninguém nos representa. Somos tantos e parece que ninguém compreende a nossa situação. Não é triste? Sentir solidão numa das profissões que lida com mais gente. Triste paradoxo. 

Não é triste ter que iniciar mais um ano letivo com um sentimento de derrota? Não é triste querer fazer algo, o que for, mas constatar que todos nos queixamos mas ninguém se levanta. Porque achamos que não servirá de nada, dizemos. Repetimos. Enquanto tomamos mais um café amargo e engolimos as mágoas e o orgulho.  

Sabem como cheguei aqui? Como cheguei ao ponto de vos escrever estas linhas? Vou-vos contar. Porque todos os anos, em todas as escolas por onde já andei, sei de mais um professor que sucumbiu à depressão. Coitado, dizemos. Enquanto vamos pensando quando chegará a nossa vez. 

Cheguei aqui porque os concursos de professores são esgotantes e injustos. Tremendamente injustos. Com mudanças das regras todos os anos, não havendo um mínimo de respeito pelas vidas das pessoas. Com ultrapassagens que geram discórdia. (Supostamente temos concursos de 4 em 4 anos, mas as leis mudam anualmente. Que lógica é esta?). 

Cheguei aqui porque atravessámos uma pandemia, custeando do nosso bolso as aulas em casa, fazendo tudo o que estava ao nosso alcance para que os nossos alunos passassem por ela o menos lesados possível. 

Cheguei aqui porque cada vez me pedem mais. Mais papéis. Mais reuniões. Mais formações. Mais formas de diversificar as aulas. Mais, mais, mais... Sem querer saber como. Como é que o conseguimos fazer? Já pensaram? Claro que é em detrimento da nossa vida pessoal e dos nossos interesses. Anulamo-nos para fazer acontecer. Anulamo-nos para que as escolas não parem. 

Cheguei aqui porque a inflação continua a sua escalada e os salários não aumentam. Mas temos de continuar a atestar o depósito para ir trabalhar longe de casa com um sorriso no rosto. 

Cheguei aqui porque gostar dos alunos não chega. Gostar de ensinar não chega. Ser bom comunicador não chega. E sabem porque não chega? Porque a despensa de casa não se enche com sorrisos e abraços. 

E já chega da conversa de que os professores são missionários. Não são. Os professores são pessoas normais, com problemas reais, salários que não pagam o seu trabalho e estão tremendamente cansados e descontentes. E só não sabem como demonstrá-lo. 

 

escola-2.png

(Imagem aqui)

02
Dez20

Notícias que me estragam o dia

C.S.

Todos sabemos que, com esta pandemia, vamos entrar numa crise económica superior à de 2008. Sabemos que vivemos num país que, não contando com prémios de turismo ou resultados futebolísticos, anda sempre na cauda da Europa. Um país que não tem verbas para a cultura, que ignora as dificuldades que os setores da restauração e do divertimento noturno atravessam, que fingiu que reforçou o SNS, que tem escolas com amianto, sem aquecimento e onde chove (sim! é verdade, asseguro-vos), que não tem creches nem lares suficientes, etc. Mas que continua a financiar bancos e que vai dar 11 milhões de euros para um evento que se está a realizar online, Web Summit. Sim, é verdade. 

E isto é revoltante. É desesperante. Porque não consigo deixar de sentir que neste país estão constantemente a gozar comigo. Connosco. Com cada um de nós. 

"Portugal é pobre."

"Apertem o cinto."

"Cada português tem uma dívida de x euros."

Quantas vezes já ouvimos estas frases? Quantas vezes mais iremos ouvi-las? 

Quando teremos coragem para dizer que basta? Estamos fartos. 

E sabem o que é que eu sinto? Verdadeiramente? Que não é uma questão de políticos mais à esquerda ou mais à direita, porque todos eles parecem ingorar-nos. Esquecer-nos quando se sentam na Assembleia.

E se assim é o que nos sobra? Provavelmente juntarmo-nos e fazermo-nos ouvir. Aceitam-se ideias. 

 

 

 

13
Nov20

2020 - o filme de péssima qualidade

C.S.

Muito se dirá sobre este 2020 no futuro. Muito se tem dito sobre ele no presente. Independentemente da forma como tem afetado cada um de nós, creio que será difícil encontrar alguém que o considere um bom ano. Estamos todos mais do que prontos para nos despedirmos dele e, de preferência, sem grandes alaridos, porque não há grande coisa pela qual celebrar. 

Em março, fui das primeiras a ser enviada para casa. Quando toda a gente foi posta em casa eu levava uma semana e meia de confinamento, porque surgiu um caso no meu local de trabalho. Foi um mês duro. Muito duro. E a bem da minha sanidade mental desliguei-me das notícias. E depois da TV. 

Passados tantos meses (parece que passou uma vida) continuo a querer saber o mínimo. Mas na era da informação rapidíssima tudo se sabe, não é? 

Ontem o meu concelho passou a estar sinalizado. E este mau filme de ficção científica, em que estamos metidos, parece não ter fim. 

Olho à minha volta e o que vejo é gente resignada. Estamos por tudo. Parece que 2020 nos quebrou inevitavelmente.  

Mas este ano maldito vai perseguir-nos muito mais do que desejamos. Porque vai deixar marca na nossa memória e na forma como nos relacionamos. E porque nos vai meter numa crise económica sem precedentes. 

E esta sou eu... A não querer pensar muito no assunto. A não querer dar muita importância. A não querer valorizar os problemas... Mas como fugimos desta longa metragem horrível em que nos meteram?! 

26
Out20

¡España, cariño, cómo te echo de menos!

C.S.

Na última semana li um livro cuja a ação se desenvolve entre Madrid e Valência, mas sobretudo Madrid, e fui invadida por uma saudade tremenda de um país que, não sendo o meu, posso dizer que adoro. Em Espanha já vivi momentos de pura felicidade e é um país ao qual estou ligada diariamente pelo meu trabalho. 

Acreditem ou não, um dos momentos mais duros para mim, no confinamento, foi quando começaram a fechar as fronteiras, senti que a Europa estava a erguer muros, ainda que invisíveis, e dei por mim a dizer mais do que uma vez "Eu só queria ir ali a Sevilha". Sevilha vibrante. Sevilha cheia de música e luz e gargalhadas e turistas e cultura... Tão perto (demoro o mesmo tempo a chegar a Sevilha que demoro a chegar a Lisboa) e sentia-a tão longe. Tão triste. 

Esta manha acordei com a notícia de que Espanha voltou a decretar estado de emergência, que pode durar até maio de 2021. Maio de 2021! E eu voltei a sentir um vazio. Depois vi imagens noturnas de Madrid e Barcelona completamente desertas. Madrid e Barcelona silenciosas, escuras e frias. Madrid e Barcelona a precisar de calor humano, que agora se parece ter convertido em algo pérfido. Não consegui evitar sentir um nó na garganta e os olhos rasos de água. 

¡España, cariño, cómo te echo de menos!

 

(Imagem aqui)

22
Mai20

Unidos pelo presente e futuro da Cultura em Portugal

C.S.

Não, não sou artista. Infelizmente. Mas sou leitora, espectadora, ouvinte, faço parte do público. Gosto de olhar para quadros, mesmo que não os saiba interpretar. E adoro fotografia.
Aplaudo. Rio. Choro. Às vezes grito. Outras vezes fico sem palavras.
Já me arrepiei. Já fiquei frustrada. Já ri até às lágrimas.
Mas nunca fiquei indiferente.
A Cultura é capaz de nos proporcionar tudo isto e ainda mais. Fica em nós. Transforma-nos. Identifica-nos. Se a genética nos explica a nossa origem, a cultura faz de nós quem somos, porque somos altamente influenciados pelos livros que lemos, os filmes que vimos, as séries/programas de tv que consumimos, as músicas que ouvimos em loop, a peça de teatro que vimos e não esquecemos...
Não tenho qualquer dúvida de que eu não seria a pessoa que sou hoje se não tivesse aprendido a apreciar a leitura aos 10 anos. Ou se não tivesse ido ao teatro sempre que podia, na adolescência, na companhia da minha melhor amiga, que hoje é atriz. Ou se não tivesse crescido a ouvir Rui Veloso e os Da Weasel nos anos 90. Ou se não tivesse visto todos os filmes que vi. 

Eu não sei o que seria. Mas não seria a mesma coisa, porque a cultura molda-nos. E nós precisamos dela para crescer.
É altura de retribuir.
É altura do país retribuir.

20200521_180948_0000.png

      (Imagem criada com a APP Canva)

28
Mar20

Eventualmente ficará tudo bem

C.S.

"Vamos ficar todos bem."
É uma frase que adoptámos para nos dar conforto e esperança. Um frase que pedimos às crianças que pintassem, chutando, dessa forma, o medo para longe.
Uma frase que nos agarra à vida quando morte anda à solta, mais acutilante que nunca.


Mas os números estão aí. Todos os dias, com hora marcada. A cada dia mais assustadores.


Eventualmente ficará tudo bem, exceto para os que partem. Exceto para os que foram para o hospital e não conseguiram sair de lá com vida. Sem oportunidade de ver familiares e amigos, ainda que por uma última vez.


Ficará tudo bem, sim. Mas não esqueceremos quem já cá não estará para os abraços apertados e os jantares demorados.


Estes dias lembram-nos que Pessoa tinha a razão do seu lado quando, sob o heterónimo de Alberto Caeiro escreveu: Quando chegar a Primavera, se eu já estiver morto, as flores florirão da mesma maneira.

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18
Mar20

Possível estado de emergência

C.S.

E hoje, que estou fechada em casa, a minha memória traz-me aqui, à serra, aos longos e felizes dias de verão em que andei à descoberta do nosso país.
Olho para esta foto e vejo liberdade.

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Se hoje for decretado o estado de emergência em Portugal perderemos um pouco da nossa liberdade, mas lembrem-se que é por um bem maior, é para que possamos mais rapidamente sair das nossas casas e voltarmos a estar juntos, voltarmos a abraçar, voltarmos a poder ir onde nos apetecer.

Separados mas mais juntos que nunca, por um bem maior.

13
Mar20

É tempo de pensar em todos

C.S.

Quem me dera encontrar as palavras certas para vos confortar. Mas esta semana tem custado a passar, com a vida em suspenso, planos adiados, trabalho acumulado e sonhos que se desfazem é difícil reunir o ânimo de vir até cá. E não falta tempo.

 

Sinto que tenho estado entorpecida. Recordo os dias da semana passada como se tivessem sido há muito, muito tempo. Lembro-me das caras de desilusão das minhas alunas quando lhes disse que íamos cancelar a visita de estudo a Espanha, agendada para dia 03/03. Disse-lhes que as preferia ver zangadas do que com pneumonia e aí ficaram sem resposta, mas nos seus olhos vi que me acusavam de excesso de zelo. Não me importei, antes assim.

 

Lembro-me de passar a semana a comentar com os meus colegas que o assunto era mais sério do que parecia no início e, aos poucos, todos se foram começando a consciencializar que sim. Ia pondo gel desinfetante nas mãos quando mais ninguém o fazia. Todos comentavam que havia gente na escola que tinha regressado de Itália. E todos queríamos acreditar que tudo iria correr bem porque, afinal, estavam na escola com o consentimento das autoridades de saúde. E foi o que se viu...

 

Lembro-me que participei numa  feira organizada pela câmara municipal, com a representação de todas as escolas da cidade, quinta, sexta e sábado, e lembro-me de pensar: "não devíamos estar aqui, mas porque não foi isto cancelado?!", enquanto olhava para os miúdos a fazerem coreografias ensaiadas ou enquanto reencontrava velhos conhecidos que me cumprimentavam afavelmente e aos quais não tive coragem de dizer para manterem a distância recomendada.

 

Lembro-me de tudo isto e penso que era inevitável que tenhamos chegado aqui, porque somos de afetos e porque tendemos a acreditar que só acontece aos outros.

 

Agora? Agora é manter a calma e sermos os melhores cidadãos de que há memória, ou seja, cumprir com o que nos é pedido. Acalmar. Ficar em casa quem pode ficar. Ter muito cuidado e tomar todas as medidas preventivas a quem anda na rua, a quem tem mesmo de ir trabalhar. Ajudemo-nos.

 

Separados mas juntos. A pensar nos idosos, a pensar em quem tem asma, a pensar nos doentes cardíacos, nos diabéticos, nos doentes oncológicos...

Separados mas juntos, para que todos possamos voltar a ser, o mais rápido possível, o povo caloroso, beijoqueiro e afável que somos, mas até lá contenção. Separados mas juntos. 

 

É tempo de pensar em todos. 

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Imagem retirada da conta de IG de Nádia Sepúlveda.

 

(E ainda bem que o governo tomou as medidas que tomou ontem, até poderiam ter ido mais além. Mas já foi bom. Esperemos que cheguem.)

 

11
Mar20

Um domingo (quase) perfeito

C.S.

Domingo esteve um dia espetacular.

Aproveitei-obem, parecia que estava a adivinhar que ia entrar numa espécie de quarentena. Digo espécie porque não estou em isolamento social oficial, ou seja, não me foi dito que me teria de submeter a ele, mas a minha consciência é o que me manda fazer após duas pessoas, (com quem não tive contacto direto), do meu local de trabalho testarem positivo ao covid-19 e, consequentemente, o meu local de trabalho estar encerrado.


É engraçado que eu gosto tanto de escrever, mas às vezes as palavras não saem, ficam presas dentro de mim. E só hoje tive realmente vontade de vir até cá.


Acho que por esta altura já ninguém diz que é uma simples gripe. Ao menos isso. Agora falta que tenhamos consciência do que está realmente a acontecer e atuemos em consonância. Sejamos responsáveis, respeitadores e conscientes de que estamos todos no mesmo barco.

 

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